05 jul 560 árvores por dia: agroextrativistas marajoaras plantam mais de 100 mil mudas no último semestre
Esforço conjunto visa à restauração florestal e a produção de alimentos
Reunidos em mutirões, um grupo de homens e mulheres agroextrativistas de Breves, Melgaço e Portel, no Marajó (PA), plantou 101.724 mudas de espécies agroflorestais entre dezembro de 2022 a junho de 2023.
Mais de 25 espécies nativas da Amazônia foram inseridas em Sistemas Agroflorestais (SAFs), método de plantio que reúne diferentes tipos de espécies agrícolas na mesma área e ao mesmo tempo (consórcios), com ciclos distintos (curto, médio e/ou longo).
Os SAFs implantados contém arranjos com açaí, cacau, cupuaçu, andiroba, pracaxi, pupunha, juçara e ucuuba, enriquecidos com espécies de ciclo curto e semi-perene como banana, mamão, abacaxi, mandioca, macaxeira, milho e feijão caupi.
Da comunidade Santa Luzia, do Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) Ilha Grande de Laguna, em Melgaço, Maria Aldenora Maia conta que o plantio representa uma chance de diversificação da produção.
“Primeiro plantamos 500 mudas na roça que já tínhamos pronta. Depois trouxemos mais 3 milheiros, ocupando espaço como as roças de mandioca. Nós já estamos planejando aumentar os espaços, para quando começar a produzir termos sempre algo para colher. Esse plantio representa mais alimentos e renda para a comunidade”, relata Maria.
A ação começou a tomar corpo em maio de 2022, com a coleta de sementes e o cultivo de mudas agroflorestais. Esse processo foi impulsionado pelos projetos Marajó Socioambiental 2030 e Sanear Marajó, implementados pelo Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), com apoio financeiro do Fundo Socioambiental da CAIXA e parceria da Fundação Banco do Brasil, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e Fundo Amazônia.
Para a estratégia de produção de mudas, o projeto contou com a parceria do Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade do Estado do Pará (Ideflor-Bio), por meio de uma cooperação técnica que possibilitou o uso de viveiros instalados na região, doação de sementes e realização de oficinas de produção de mudas.
De Breves, no sudoeste da Ilha de Marajó, o presidente da Cooperativa da Agricultura Familiar e Agroextrativista Regional (Cafar) e do Conselho de Segurança Alimentar Municipal, Luis Silvério, comemora as mais de 36 mil mudas plantadas no município nesta primeira janela agrícola do projeto.
“Eu me preocupo muito com o meio ambiente, então pra gente é muito importante esse projeto de restauração da floresta, né? Estamos trabalhando ainda em forma de mutirões e a gente sabe que está fazendo um trabalho para produzir alimentos de qualidade, mas com sustentabilidade para o município, para o Estado e para o Brasil”, afirma Silvério.
Engenheira agrônoma e analista socioambiental do IEB, Deborah Pires comenta que a estratégia de produção de mudas e do preparo de área de plantio ter sido feita de forma coletiva foi determinante para os agroextrativistas alcançarem a marca das 100 mil mudas plantadas.
“Um dos maiores desafios para o plantio em larga escala na Amazônia é a disponibilidade de sementes e mudas agroflorestais da região. Então restaurar e implementar viveiros comunitários, envolvendo e dando protagonismo às famílias agricultoras, fez toda a diferença”, enfatiza Pires.
“Além disso, cultivar SAFs é cultivar alimentos e promover renda a curto e longo prazo. Essa percepção é muito atrativa aos agroextrativistas, além de que o SAF permite liberdade de arranjos em diferentes formas, priorizando as cadeias produtivas mais pertinentes em cada realidade espacial”, afirma a engenheira agrônoma.
Do Projeto Estadual de Assentamento Agroextrativista (Peaex) Acangatá, situado em Portel, Robson Machado conta que a comunidade escolheu um dia da semana para se dedicar à agenda de restauração ambiental. “Iniciamos a produção de mudas, com um trabalho coletivo, sempre às segundas-feiras, a organização do plantio também seguiu a mesma lógica”.
Cerca de 120 famílias foram envolvidas diretamente no plantio. Os agricultores e agricultoras seguirão mobilizados na agenda de coleta de sementes e produção de mudas – a meta é plantar ao menos mais 400 mil mudas nos próximos dois anos.
Para aumentar a efetividade do plantio, as comunidades estão envolvidas em uma formação continuada, focada em implantação de SAFs e gestão, desenhada para dialogar com os saberes tradicionais dos educandos. “O curso trouxe vários conhecimentos que eu não tinha e também me deu a oportunidade de conhecer lugares com plantios que deram certo, me mostrando que devemos valorizar mais o que temos em nossas florestas e na própria comunidade”, compartilha Elizandra Machado, da comunidade Menino Deus.
A iniciativa articula diferentes parceiros, entre organizações da sociedade civil, órgãos governamentais e de ensino. “Essa ação que estamos desenvolvendo no Marajó envolve uma agenda de formação de lideranças agroextrativistas, recomposição florestal em territórios fortemente impactados pelo desmatamento e o estabelecimento de novas cadeias da sociobiodiversidade. Para isso, estamos articulando o engajamento de órgãos governamentais nas esferas municipal e estadual, para que seja possível cumprir com a meta e expandir essa iniciativa para outros municípios”, informa a engenheira agrônoma Deborah Pires.