18 ago No Marajó, agroextrativistas concluem curso sobre restauração florestal e gestão
A formação durou seis meses e abordou temas relacionados à implantação de Sistemas Agroflorestais (SAFs) e formas de organização social
No arquipélago do Marajó (PA), 32 homens e mulheres se reuniram na região da Ilha Grande, nos dias 10 a 12 de agosto, para o quarto e último círculo de saberes do Formar Restauração e Gestão. Os educandos são moradores dos Projetos Estaduais de Assentamentos Agroextrativistas (Peaex) Acutipereira, Alto Camarapi e Acangatá, no município de Portel; dos assentamentos Monte das Oliveiras e da Reserva Extrativista (Resex) Mapuá, em Breves, territórios estaduais sob a gestão do Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade do Estado do Pará (Ideflor-Bio).
A agenda integra o projeto Marajó Socioambiental 2030, realizado pelo Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), com apoio financeiro do Fundo Socioambiental da CAIXA, e parceria do Fundo Amazônia, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e Fundação Banco do Brasil.
Sob o tema organização e inclusão socioprodutiva para produtos da sociobiodiversidade, o círculo formativo foi orientado à discussão da importância de organizações sociais como os sindicatos, as associações e as cooperativas e apresentação de políticas públicas socioambientais. A facilitação foi realizada por Romier Sousa, professor e pesquisador do campo da agroecologia, e por José Romano, professor, pesquisador e um dos integrantes da Cooperativa D’Irituia, referência na produção e comercialização de produtos da sociobiodiversidade pela agricultura familiar no nordeste paraense.
Nós estamos demonstrando o papel estratégico que as associações possuem na organização do território e como as cooperativas podem ser elemento central do desenvolvimento econômico e social dessas comunidades”, comenta Romier Sousa.
O Formar Restauração e Gestão foi concebido como uma estratégia de engajamento para garantir a efetividade do plantio de 500 mil mudas florestais e agrícolas, uma das metas do Marajó Socioambiental 2030.
“Todos que participaram desse curso estão envolvidos diretamente no processo de produção e plantio de mudas. Desde janeiro de 2023, trabalhamos as boas práticas da agricultura familiar para uma agenda de restauração e, na primeira janela agrícola do projeto, conseguimos garantir o plantio de mais de 100 mil mudas”, explica Marcos Silva, analista socioambiental do IEB.
Situada a cinco horas de barco da sede do município de Portel, a comunidade Menino Deus Lega, do Projeto Estadual de Assentamento Agroextrativista (Peaex) Acangatá, é um dos territórios envolvidos no projeto. Técnico agrícola e morador da comunidade, Robson Machado conta que a formação ajudou a fortalecer as relações de reciprocidade na comunidade.
“Esse trabalho do viveiro e da produção de mudas veio fortalecer a questão econômica e a aproximação das pessoas. No Acangatá nós começamos com cerca de 16 pessoas e hoje já tem 62 envolvidas, porque as pessoas começaram a perceber a importância da produção de mudas. Nos unimos em mutirões e daqui a 4 ou 5 anos vai ter uma produção boa e diversificada, e com isso a gente tem a possibilidade de uma vida melhor”, afirma Robson.
Moradora da mesma comunidade, Elizandra Machado conta que o curso trouxe novas perspectivas sobre o território. “O Formar me fez ter um olhar diferenciado para a natureza, valorizando mais o que a gente tem dentro das nossas comunidades. E também me fez observar a questão de organizar as produções, das mulheres principalmente, para a gente ter mais decisões dentro das organizações e das reuniões”, reflete Elizandra.
Do Peaex Acangatá, a artesã Silmara Santos, divide seu tempo entre as tarefas domésticas, a roça e a criação de biojoias feitas com sementes que ela mesma colhe e beneficia. Para ela, o curso trouxe conhecimentos que auxiliaram na redução de gastos da família.
“O curso me mostrou caminhos diferentes, como a adubação orgânica. Ensinaram a gente a fazer o adubo líquido, sem precisar comprar agrotóxico. Isso está sendo muito bom, até mesmo para eu trabalhar com as minhas sementes”, destaca Silmara.
Encerramento – O círculo encerra um processo formativo de 160h, iniciado em janeiro de 2023. Construído a partir da Pedagogia da Alternância, com círculos alternados entre Tempo Escola (TE) e Tempo Comunidade (TC). O Formar Restauração e Gestão foi facilitado por analistas socioambientais do IEB e por consultores especializados em agroecologia, sistemas agroflorestais, cooperativismo, economia solidária e comercialização de produtos da agricultura familiar e sociobiodiversidade.
A formação abordou conhecimentos sobre sistemas produtivos sustentáveis, práticas agroecológicas e recuperação de áreas degradadas, introdução de área de coleta de sementes (ACS) e produção de mudas, finalizando com o tema de organização socioprodutiva.
“Eles já fazem isso de alguma maneira, a partir das igrejas, dos grupos de mulheres e jovens, por exemplo. O debate sobre o cooperativismo despertou muito interesse, porque geralmente eles são submetidos a formas de comercialização extremamente desiguais, então se eles estiverem organizados, podem conseguir estratégias e preços melhores, atingindo mercados como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), que são institucionais, mas também mercados privados”, analisa Romier Sousa.
Parcerias – Para a estratégia de produção de mudas, o projeto contou com a parceria do Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade do Estado do Pará (Ideflor-Bio), por meio de uma cooperação técnica que possibilitou o uso de viveiros instalados na região, doação de sementes e realização de oficinas de produção de mudas.
Este é o segundo curso do IEB focado em restauração florestal. Em maio deste ano, por meio do Floresta para Sempre, projeto realizado pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), com o apoio do IEB, 34 agricultoras e agricultores familiares de assentamentos rurais do município de Ulianópolis, no Sudeste do estado, se formaram como agentes em restauração florestal. Foram plantadas cerca de 13,5 mil mudas de árvores nativas em áreas desmatadas nos assentamentos rurais de Ulianópolis, com foco em oito espécies que vão gerar renda às famílias a curto, médio e longo prazo: açaí, pupunha, cacau, cupuaçu, ingá, buriti, castanha e andiroba.
Próximos passos – Analista socioambiental do IEB, Marcos Silva conta que os cursistas estarão envolvidos no processo de organização das associações locais e das cooperativas, pensando na produção de mudas como um ativo comercial.
“Os SAFs que foram implementados vão começar a gerar renda e eles precisam compreender como comercializar essa produção, como acessar o mercado e aí vem o componente de organização social. A gente deixa aqui uma pista para a próxima formação, que é avançar o processo de fortalecimento das organizações locais”, pontua Marcos.